domingo, 20 de junho de 2010

LENDAS DE PORTUGAL - XX - ALBERGARIA-A-VELHA

A Terra do Anjo
Sabem qual é a Terra do Anjo? Não? Pois vejamos a lenda que nos pode dizer alguma coisa sobre esta questão. Vamos atá à margem direita do Vouga, a duas léguas da cidade de Aveiro. Aí, há muitos anos, existia uma pequena aldeia de pescadores que trabalhava nas águas do rio. E nessa comunidade havia um homem, já entrado na idade, que nunca casara e vivia no sofrimento de não ter um filho a quem ensinar a sua arte e fosse sua companhia no fim da vida.
A lenda não lhe guarda o nome mas regista que se tratava de uma pessoa extremamente devota a Nossa Senhora. Assim, constantemente lhe dirigia orações, por entre as quais lhe pedia um filho, nascesse este de mulher que com ele casasse ou criança abandonada. Às vezes, desencantado com a falta de resposta de Nossa Senhora, dirigia as suas palavras ao rio, seu íntimo no quotidiano. E uma manhã, levando o seu barco de um lado paro o outro, o pescador viu uma caixotinha a boiar nas águas, e dentro dela chorava uma criança. Doido de contentamento, agradeceu a Nossa Senhora, interrogando-a sobre o que ela queria em troca, naturalmente ela não lhe respondeu.
Assim, o rapaz foi crescendo, aprendendo a vida com o velho pescador, que arranjou outro ânimo para encarar a vida. Toda a gente andava admirada com a felicidade daquela nova família! Porém, a partir de determinada altura, uma nuvem cinzenta começou a pairar nos olhos límpidos do rapaz. É que ele queria saber como é que viera ao mundo. Quem era a sua mãe? E seu pai? A história, aliás verdadeira, do seu aparecimento nas águas, contada pelo velho pescador, não o consolava. Ele queria ser como os outros. E não conseguia. Num esforço para desanuviar a existência do seu rapaz, o velho pescador do Vouga levou-o com ele à cidade e foi falar com um padre que tinha fama de muito sabedor. Mas há casos em que os saberes não servem para nada. E ao padre apenas lhe valeu certa sabedoria no trato, mandando para casa os dois pescadores, recomendando-lhes que pensassem noutra coisa. Terá também dito que muitas vezes são insondáveis os desígnios do Altíssimo...
Bem, a vida continuou e, um dia, um clamoroso dia, soltou-se uma epidemia que começou a dizimar a população das margens do Vouga. O rapaz, mostrando a generosidade aprendida com o seu velho pai, atendeu aos doentes. Porém, por desgraça, ele próprio foi apanhado pela terrível doença. Prostrado no leito, a seu lado tinha o velho a lamentar-se de o ver naquele estado, que piorava em cada dia. E o pai voltou-se de novo para Nossa Senhora, implorando-lhe que lhe salvasse o filho. E à voz do "valei-me!", entrou no quarto uma mulher envolta em neve, dizendo: "Aqui estou". Era Nossa Senhora das Neves, dizendo que vinha buscar o rapaz para a sua corte de anjos.
Assim como o dera, o levava para um lugar de glória, reservando-lhe a função de anjo da guarda daquela terra. Que terra? Angeja.

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