OS TRÊS MILAGRES
Dirija-se o leitor a Celorico da Beira, aí decerto encontrará placa indicativa da Aldeia Rica, a uns oito quilómetros. Siga pela estrada até lá chegar, onde não terá dificuldade em encontrar a igreja da Nossa Senhora dos Açores. Entre e repare em três painéis assim intitulados: "O aparecimento da Virgem ao rústico da vaca", "O açor pousado na mão do caçador" e "O filho rei, já ressuscitado". Pois aí acaba a lenda que vamos começar. Ora escutem.
Andava um pastor de Aldeia Rica com as suas vacas quando uma delas se espantou e caiu ao rio. Vai o homem a querer salvá-la e também ficou em perigo de vida. Então ele lança um grito:
"Valei-me, minha Nossa Senhora!"
E o pastor e a sua vaca tresmalhada salvaram-se, não tardando que aquilo fosse levado à conta de milagre. E a população, sempre grata a estes sinais, ergueu uma pequena capela a Nossa Senhora. Também não tardou que se multiplicassem os milagres e a fé, a ponto da fama ter chegado a um rei de um recanto da Península.
Nesse pequeno reino, os monarcas viviam com o desgosto de não terem um filho. Sabedores das maravilhas operadas em Aldeia Rica, rezaram, a Nossa Senhora, que não os fez esperar mais do que o tempo devido. Porém, um acidente qualquer fez com que a criança ficasse defeituosa, o que amargurava muito os reis seus pais. Chamaram médicos de todas as partes, mas acabaram por se voltar, uma vez mais, a Nossa Senhora de Aldeia Rica.
Discutiram se deveriam pôr-se a caminho, dada a debilidade do filho. Venceu a mãe, que entendeu valer a pena a jornada. Porém, a criança desfaleceu e morreu quando até já nem faltava muito para terminaram a viagem aos pés de Nossa Senhora. Mesmo assim, em vez de permitir que lhe enterrassem o filho, a rainha quis levar o corpo nos braços para o deixar aos pés da Virgem. E o rei fez-lhe a vontade.
Quando chegaram a Aldeia Rica, a rainha foi cumprir o prometido. O rei saiu a caçar com os da sua comitiva. Às tantas, um dos seus homens largou em liberdade o açor que levava no braço. Denunciado, o rei logo julgou e mandou que lhe cortassem a mão direita. O homem defendia-se dizendo que os pássaros tinham o direito à liberdade.
E quando o executor se preparava para cortar a mão, o açor deu uma volta e colocou-se sobre ela. Ao mesmo tempo, a rainha dava um grito porque o filho recobrava vida e ficava curado dos seu males. Emocionado, o rei mandou soltar o prisioneiro, ordenando que soltassem imediatamente os outros açores. E ali mesmo mandou erguer uma igreja a que deu o nome de Nossa Senhora dos Açores, ainda hoje motivo de admiração de toda a gente.