A três léguas de Torres Vedras fica Freiria, uma freguesia vizinha da Serra da Romã. A verdade é que só antigamente havia belas romãzeiras naqueles montes, hoje só lá aparece uma de longe a longe. Mas aquilo, no tempo antigo em que se passa esta lenda, aquilo era território de uma condessa chamada Eleurica, que tinha um filho a quem dera o nome de Pedro. E se a condessa estava no seu palácio a gerir os seus bens, o filho corria mundo, entre viagens e guerras, dizendo-se à boca pequena que levava uma vida libertina.
E naquele dia, o dia da Festa das Flores, D. Eleurica, apanhando o filho na terra, obrigara-o a juntar-se-lhe e assistir à cobrança das rendas e à recepção de prendas que os seus vassalos concentravam logo pela manhã. Com a pior das disposições, Pedro assistia à chegada dos camponeses, à entrega a seus criados do que figurava nos contratos mais um porco, uma galinha, cereais, etc. Faziam-lhes as devidas vénias e iam para a festa.
De repente, Pedro ficou de olhos postos numa jovem, a moça mais bela que ele poderia conceber, que se apresentava com a mãe, uma pobre viúva. Interessou-se por ela e perguntou-lhe o nome, ficando a saber que se chamava Maria, para que lados morava, para o cimo da Serra da Romã, e mais umas coisas. A condessa cortou a conversa, em que a rapariga participava corando de vergonha e timidez.
A terminar a sessão, D. Eleurica censurou o filho, que lhe disse fizera aquilo por mero passatempo. Mas qual passatempo! Dias depois, Pedro saltava para cima de um cavalo e subia a serra, seguindo o caminho das flores de romãzeira. Lembrava-se muito bem de ter dito à rapariga que ela era ainda mais bonita que aquelas bonitas flores. Por fim, numa volta do caminho deu com a Maria.
Maria estava sentada, olhos postos no horizonte, sonhando. Chamou-a, corou. Declarou-lhe o seu amor e ela, apesar da timidez inicial, também lhe confessou que o amava desde o primeiro dia em que se viram, na Festa das Flores. Abraçaram-se. E durante muitos dias passaram a encontrar-se naquela belíssima serra que lhes servia de cenário.
Porém, a condessa soube destes amores e chamou o filho, obrigando-o a jurar que se afastaria da namorada. Ele mandou à rapariga a cestinha de flores que ela lhe dera no dia em que se conheceram e partiu, sem a ver, para uma guerra. Desgostoso, procurava nos combates encontrar uma solução extrema para a sua paixão contrariada. Quanto a Maria, a jovem deixou de comer, definhando até ao extremo. Porém, a condessa que sempre sabia o que se passava no seu condado, foi visitá-la. Comoveu-se ao ver ao estado de inanição a que ela chegara. E disse-lhe umas palavras atenciosas, acabando mesmo por desobrigar o filho da jura que lhe fizera. Só que falou demasiadamente tarde, pois Maria expirou logo ali. Avisado pela mãe, Pedro veio das guerras e tão desgostoso ficou que recolheu a um convento. E com a sua grande fortuna dedicou-se a apoiar o jovens casais sem dote, por isso lhe chamavam o monge casamenteiro.