terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

FABRICAÇÃO DE CERVEJA

O surgimento desta bebida parece ter acontecido de forma concomitante em diversas partes do mundo antigo. Encontraram-se vestígios da sua  preparação  na antiga Mesopotâmia e no Egito. Os romanos a chamavam de cerevisia e os celtas korma. Na Idade Média existiam variedades com um teor alcoólico bastante baixo para consumo inclusive de crianças.

Hoje, ele é uma das bebidas mais consumidas no mundo e faz parte da cultura de muitos povos, mas em pouco deles se fundiu de maneira mais intima e harmónica com a sociedade e suas tradições do que no mundo germânico, especificamente na Baviera. Bebida para todas as idades e classes sociais, era preparada para crianças. adultos e anciãos, camponeses, estadistas, nobres e clérigos.
As abadias e conventos da região costumavam fabricar cerveja para consumo próprio, variando a forma de preparo segundo os diversos tempos do ano. Assim, por exemplo, a Paulaner Salvatore era elaborada pela Ordem dos Mínimos, com vistas ao jejum feito pelos monges durante a oitava da festa do Fundador. Como essa bebida, embora muito nutritiva, não quebrava o preceito, seu consumo ajudava a sustentar os religiosos nos períodos de penitência.
Muitos mosteiros beneditinos também produziam sua própria cerveja e não apenas para consumo próprio. A abadia Weltenburg, situada nas margens bávaras do Danúbio,é a que possui a mais antiga destilaria, fundada em 1050. Desde então vem produzindo sem interrupção a mesma variedade de cerveja e transcorrido um milénio sua qualidade por certo não deixa a desejar, pois consta ter sido fornecida regularmente para a mesa de Bento XVI.

O Decreto de Pureza de 1516

Ora, para produzir uma cerveja como a de Weltenburg, os ingredientes não podiam, ser mais simples: lúpulo, malte e água. Quase cinco séculos depois, esses três elementos foram sancionados num decrete promulgado em 23 de Abril de 1516 p+elo duque Guilherme IV da Baviera: o Reinheitsgebot ou  "Lei da Pureza". Além de estipular os preços do líquido dourado entre as festas de São Jorge e de São Miguel, prescreve o decreto: "Desejamos enfatizar que no futuro em todas as cidades, nos mercados e no país, os únicos ingredientes usados para a fabricação da cerveja devem ser lúpulo, malte e água. Qualquer um que negligenciar, desrespeitar ou transgredir estas determinações, será punido pelas autoridades da corte que confiscarão tais barris de cerveja."
A simplicidade e candura deste dispositivo legal não podem deixar de chamar a atenção nos nossos dias, tão pródigos em conservantes, estabilizantes, corantes, espessantes, acidulantes, aromas artificiais e demais aditivos, usados às vezes em   tais proporções que tornam difícil distinguir o sabor degustado.
Transmitido e respeitado de geração em geração, o procedimento de fabricação da cerveja alemã, muitas vezes artesanal, tem se imposto ao longo dos tempos como condição indispensável para a preparação de uma cerveja arquetípica. Muitas embalagens ostentaram com orgulho a indicação: "Fabricada de acorde com a Lei da Pureza de 1516".


Património da humanidade

No fim do ano passado, a Associação de Cervejeiros Alemães pediu à UNESCO o reconhecimento da cerveja assim fabricada como património da humanidade. A decisão poderá ser tomada em 2016, quando se comemorará o V Centenário da promulgação do mencionado decreto.
Alguns produtores, inclusive alemães, têm objetado que tal lei condena à imobilidade de algo que poderia ser aperfeiçoado. Em suma: ela é retrógrada. Mas basta analisar a questão com um pouco de isenção de ânimo para constatar quão errado  é esse posicionamento. Atualmente existem, por exemplo na Bélgica, cervejas excelentes feitas segundo outros métodos que acrescentam ingredientes tão pouco "ortodoxos" como a cerveja.
Não se trata de proibir os aprimoramentos, mas sim de proteger da voragem moderna uma tradição venerável que, queiramos ou não, está na essência de uma das mais populares bebidas dos nossos dias.

Revista Arautos do Evangelho -Fevereiro 2014 -



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