sábado, 31 de março de 2018

LENDAS DE PORTUGAL - 112ª - MONTEMOR-O-NOVO

AS DUAS ARCAS

O conde de Monsaraz poeta alentejano, assim pôs em verso a Lenda das Arcas:

Entre escombros na rudeza
De vetusta fortaleza,
Batidas de vento agreste,
Empedernidas, cerradas,
Há duas arcas pejadas,
Uma dr oiro outra de peste.

Ninguém sabe ao certo qual
Das duas arcas encerra,
O fecundo manancial
Que fartará de oiro a terra
Mesquinha de Portugal;
Ou qual, se não imprudente
Lhe erguer a tampa funérea
Vomitará de repente
A fome, a febre, a miséria,
Que matará toda a gente.

Sempre que o povo faminto,
Maltrapilho e miserando,
Fosse ele cristão ou moiro,
Entrou no tosco recinto
Para salvar-se arrombando
A arca pejada de oiro,
Quedou-se os braços erguidos,
O olhar atónito e errante,
Sem atinar de que lado
Vinha morrer-lhe aos ouvidos
Uma voz agonizante
Entre ameaças e gemidos:

"Ó povo de Montemor,
Se estás mal, se és desgraçado,
Suspende, toma cuidado,
Que podes ficar pior!"?
E nestas perplexidades
E eternas hesitações
Hão-de passar as idades,
Suceder-se à gerações
E continuar na rudeza,
Batidas de vento agreste.
Empedinadas, cerradas,
As duas arcas pejadas,
Uma de oiro outra de peste.

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