quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

LENDAS DE PORTUGAL - XXVI CARTAXO -

As panelas de libras e a cobre

Quando as tropas napoleónicas invadiram o nosso país, a par das operações militares, faziam assaltos às casas da população civil, levando consigo tudo quanto encontrassem de valor. Ora, obrigadas a fugir de um lado para o outro, as populações tiveram de ocultar os seus valores. As mais das vezes, metiam-nos em panelas de barro e em baús e enterravam-nos. Acantonados em Santarém, aqui tinham a base para todo a espécie de desmandos. Diz a lenda que tudo pilhavam "numa área de vinte léguas em redor"!
Entretanto, as populações procurava abrigar-se. E nas bandas do Cartaxo, os de Ereira foram acolher-se ao Bicho Feio, assim como um grande parte das gentes de Pontével se acolheu à vizinha Quinta da Fonte da Telha, onde existia um nicho de almas que, segunda a lenda, lhes daria protecção. Aí houve alguma organização, determinando-se que cada qual procurasse esconder, sobretudo enterrar, os seus melhores pertences até à chegada de melhores dias. É verdade que houve muitos que morreram ou foram mortos sem poderem desenterrar os seus valores, perdendo-se estes no segredo cujos donos levavam para a cova! E o interessante é que aquela comunidade temerosa do inimigo comum, defendia-se também dos seus próprios instintos, fazendo correr: "No Bicho Feio existe um tesouro. Quem o encontrar, morrerá sem dele desfrutar."
Porém, nem todos têm receado a maldição, sobretudo com o correr dos anos, chegando-se a uma altura em que não se sabe o que é de cada um. No entanto, a verdade é que ninguém tem conseguido deitar a mão ao mais pequeno espólio, quanto mais tesouro!
Falando-se de tesouros, mesmo que estes sejam provenientes de situações aflitivas como estas, a um par de séculos de nós, a verdade é que entra no jogo das lendas uma qualquer moura encantada. Pois não vamos deixar fugir a história desta.
Ela era bem linda e encontra-se, vejam lá!, junto a fonte do Bicho Feio. Pois aí mesmo a moura encontrou um homem que andava à caça. Ela gostou dele e ele dela, logo ali trocaram promessas e juramentos de amor. Bem, mas aquilo foi tão de repente que, passado algum tempo, o caçador lembrou-se que, afinal, ainda tinha de ir a sua casa e ela que o esperasse ali, pois não tardaria a regressar.
Bem esperou a linda moura...
Nunca mais voltou o seu apaixonado à fonte do Bicho Feio!
Todos os dias, a linda moura ia para ao pé da fonte esperar pelo caçador. E tantas vezes o fez que acabou por transformar-se numa cobra e,desde aquela altura, ainda não acabou a sua solidão.
E é curioso verificar, vão lá ver um destes dias!, que apesar da fonte ser de mergulho, as suas águas nunca estão quietas. Ao anoitecer elevam-se umas vozes num canto tão suave como triste.Olhando as águas nestas circunstâncias, vê-se a formação de imagens, uma delas será o vulto da infeliz moura. E quem ali passa escuta também o rastejar da cobra a caminho da água. Diz ainda a lenda que nas noites de maior calor tudo isto se escuta num bom espaço...

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