A família de Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre (1750-1839), que aos 65 anos herdaria o título de Marquesa de Alorna, como ficou para a história, não era uma família qualquer. Os seus apelidos eram dos mais ilustres da aristocracia. O pai era Marquês de Alorna e Conde de Assumar. A mãe era a quarta filha do Marquês de Távora, antigo vice-rei da Índia. Tamanha grandeza foi a causa da queda. Arrastada no processo que culminou com a chacina dos Távora, a família Alorna sofreu durante 18 anos -o pai preso no Forte da Junqueira, mãe e filhas enclausuradas no Convento de Chelas.
Leonor passou o resto da infância, a adolescência e o início da vida adulta no convento. Compensou o isolamento com intensa vida intelectual. Aprendeu línguas, estudou ciências, teve acesso a livros proibidos, cultivou a poesia, pintura, desenho e música. Numa época em que eram habituais as visitas galantes aos conventos, Leonor recebia artistas, poetas e músicos junto à grade que separava o público das freiras. Um dos seus professores foi o padre Francisco Manuel do Nascimento, mais conhecido como Filinto Elísio. Vivia-se o momento alto do movimento poético Arcádia Lusitana, que exigia pseudónimos clássicos. Leonor ficou Alcipe. Em 1777, D. José morreu. A nova rainha, D. Maria I, demitiu o Marquês de Pombal e libertou os presos políticos.
Leonor saiu do convento com 26 anos. Foi viver com a família para a Quinta do Vale de Nabais (hoje Quinta de Alorna), em Almeirim. Pouco depois, em 1779, casou-se -contra a vontade do pai- com o Conde Carlos Augusto de Oyenhausen, militar e diplomata de 40 anos, de origem austríaca, de quem teve oito filhos. No ano seguinte, acompanhou o marido até Viena, onde fora nomeado embaixador.
Ali ganhou fama como poetisa e pintora e caiu nas boas graças da imperatriz Maria Teresa e do seu filho, o imperador José II. Quando o marido foi chamado de volta a Portugal, passaram por Marselha,então em plena agitação revolucionária. O Conde de Oyenhausen morreu em 1793, em Lisboa. A viúva Leonor foi viver com os filhos para Almeirim, incentivando as raparigas da terra a aprender a ler e a escrever de acordo com um sistema que ela própria desenvolveu.
Fundou por essa altura a Sociedade da Rosa, associação secreta de tendências liberais em cujas reuniões se tratava "menos de política e mais de literatura e artes". Um dos frequentadores era o poeta Bocage. Por muito inocentes que fossem as actividades da condessa, acabaram, por despertar as suspeitas do intendente da Polícia Pina Manique. Em 1803, viu-se obrigada a partir para o exílio em Madrid e depois em Londres. Foi o início de uma longa permanência no estrangeiro, onde a futura marquesa se relacionou com alguns dos mais importantes vultos da cultura e da política europeias. As notícias da invasão de Portugal pelo exército napoleónico, em 1807, fizeram Leonor prolongar a estada em Londres. Regressou a Lisboa em 1809 -mas voltou logo para o exílio, intimada a sair do país pelo governo. É que durante a ocupação francesa a sua família distinguira-se tristemente pelo colaboracionismo: a sua filha Juliana foi amante de Junot e o seu irmão Pedro aceitou comandar a Legião Portuguesa ao serviço de Napoleão.
Em 1814, Leonor voltou por fim a Portugal. Bateu-se pela reabilitação da memória do irmão, alegando que fora forçado a aceitar as ordens do ocupante. Conseguiu recuperar o título de Marquesa de Alorna, que usou até à morte.
Apesar da idade avançada, continuou a reunir no seu salão a fina flor da intelectualidade portuguesa romântica e liberal. Entre os seus últimos discípulos contavam-se Almeida Garrett e Alexandre Herculano. Morreu no Palácio de Benfica, com 88 anos.
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