segunda-feira, 31 de março de 2014

LENDAS DE PORTUGAL - LXIV - SANTANA

A ÁRVORE DO DIABO

Não temam, este carvalho condenado há muito desapareceu. Ficou-nos a sua lenda e o lugar. Vão ao centro da freguesia de Santana e peçam a alguma pessoa idosa que os informem onde se situava aquele carvalho antigo, de porte imponente, que atravessou os séculos de tempestades frias e Verões abrasadores, como se a Madeira não existisse! Quanto àquilo ser domínio do Diabo bem parece não haver dúvidas. Ora esse carvalho tinha algumas particularidades medonhas.
Os pássaros, por exemplo, não pousavam nos seus frondosos ramos. A fonte que lhe ficava contígua só tinha água para o seu sustento. E umas estranhas mãos, um dia escavaram-lhe o tronco, abrindo uma bocarra lenhosa para um subterrâneo insondável. Inclusive se dizia que aquele buraco era uma espécie de oráculo. As pessoas chegavam lá e berravam o seu nome. Se não tivessem resposta, isso significava que o nome estava escrito no céu. Porém, se o nome fosse expelido de novo para a boca, o interessado bem poderia logo iniciar as suas penitências porque estava já condenado e deveria procurar salvar-se enquanto tinha tempo!
Ora, diz-nos a lenda da árvore do Diabo, certo dia um caçador furtivo ia atrás de uma lebre e viu-a entrar pela bocarra da árvore. E, largando a espingarda, foi atrás dela. Ah, e agora o leitor quer saber o que lhe aconteceu. Ninguém sabe, desapareceu. Ele e a lebre. A propósito, a lebre não era uma lebre vulgar, mas o Diabo disfarçado para apanhar o caçador. E a verdade da lenda é que quando os companheiros do caçador e os seus cães chegaram ao carvalho, ficaram aflitos, olhando a entrada fatal que ninguém teve a coragem de franquear. Porém, um dia, aquela árvore do Diabo ruiu estrondosamente. A água da sua fonte voltou a correr e as histórias essas nunca mais saíram das cabeças das pessoas de Santana.

E saibam agora a lenda de uma bruxa alta, magra, nariz de picareta, coxeando da perna esquerda, e que não gostava de andar a pé. Preferia, naturalmente, os ombros dos que se armavam em valentões. E estes não eram  tão poucos como isso!
A bruxa já estava localizada pelas gentes de Santana. Por exemplo, não saía daquelas casas em que o dono pusesse atrás da porta uma vassoura com a palha para cima, não usava a água-benta na igreja e algumas mães de recém-nascidos já punham as tesouras debaixo da almofada do bebé.
No entanto, não se vão sem conhecerem a lenda de S. Roque do Vale do Faial. Pois há uns quantos séculos, formou-se a paróquia de Nossa Senhora da Natividade do Faial. Dedicou-se a população à pastorícia e pediu um padre ao bispo. E invocaram S. Roque como patrono, aparecendo uma imagem sua entre a penedia da Penha d'Águia. Fizeram-lhe três igrejas sucessivas e sempre ele se ausentou delas, precedendo outras tantas tempestades que derrubavam os templos.Ainda se notam hoje as ruínas de um deles. Ora a população, vendo que o S. Roque regressava sempre às suas pedras na Penha d'Águia, fez-lhe a vontade e deixou-o lá estar. E assim continua o relacionamento entre a gente de S. Roque do Faial e o santo protector dos pastores e das suas rezes.

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