sábado, 28 de fevereiro de 2015

LENDAS DE PORTUGAL - LXXV - SANTA CRUZ

O SANTO DA SERRA

A lenda remonta aos primórdios da colonização da Ilha da Madeira. O fidalgo sesmeiro Diogo Saldanha foi para a serrania do actual espaço do concelho de Santa Cruz e ali fez erguer o seu solar. Dividiu terras, construiu casas, preparou todo o espaço colonizável, de modo a conseguir bons rendimentos. Com ele trabalham homens livres, criados seus, e escravos mouros e negros. Tinha gado, juntas de bois, cavalos. 
Uma vez, Diogo Saldanha, atento ao trabalho de todos, chamou um escravo mouro que lhe levava uma manada de bois a pastar longe dali, ralhando-lhe porque todos os dias ele chegava depois da hora prevista. Gritava-lhe, batia-lhe e ele nada dizia, fora os queixumes. Porém, acabou por responder, dizendo-lhe o que se passava:
"Senhor, um dos bezerros desertou da manada e tive de procurá-lo durante muito tempo entre o matagal. E não consegui encontrá-lo. Valeu-me frei António, com uma voz que parecia vir do céu, que me guiou até onde estava o bezerro. Era um frade franciscano, disse-se enviado do céu e quer ser protector da nossa gente. No entanto, deseja que seja construída um,a capela para guardar a sua imagem. Quer-a lá em cima, na serra."


O fidalgo ficou furiosa. Como é que se atrevia o frade a entrar nas suas terras sem estar autorizado? E no dia seguinte mandou um grupo armado para lhe dar uma tareia e trazê-lo à sua presença. Não bateram no frade nem o trouxeram ao amo.  Trouxeram foi a estranha história de um sítio onde os bois ajoelhavam e depois bailavam, contentes com o sítio. Seria ali a capela?
Saldanha adoeceu de certa gravidade. Em sonho aparecera-lhe Santo António que lhe oferecera a salvação da vida em troco da ermida. Aceitara a troca e imediatamente se pôs bom, dando ordens para que a capela fosse construída. Houve dificuldade em conseguir um lugar onde o santo não desse sinais de desagrado. É que começavam num lado e as obras feitas eram desfeitas numa noite, aparecendo a ferramentas noutro lado, mas também não era a~i. O pobre do escravo mouro é que parecia ser o interlocutor privilegiado de frei António.
Por fim, o sítio apareceu mas era impossível levar para lá materiais de construção. Pois esses materiais aparecera à superfície do terreno. Nem mais nem menos do que o necessário. E deu para erguer a capela do santo da Serra que ainda lá está hoje. Pelo menos a lenda garante-o!
E Santo António,  recolhido na sua primeira capela madeirense, estava encantado. De toda a parte faziam romarias até ali. Fez bonitas as raparigas feias, favoreceu casamentos, nasceram ranchos de crianças. O pessoal da sesmaria de Diogo Saldanha encontrou-se com jovens procedentes ou a viverem noutros locais da ilha, namoravam, casaram, os escravos ganhavam alforria. O Santo da Serra parecia polarizar aquele universo de uma terra a despontar.
O grande taumaturgo português apoiava o desenvolvimento daquela gente e não tardou que o  que seria o futuro município Santa Cruz se transformasse na parte mais populosa da ilha.





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