ALGARVE - Burro abandonado recupera no Algarve e já "percebe" inglês
"Branquinha" tem 30 anos e foi salvo por um britânico que o acolheu numa quinta.
Animais são abandonados junto ao portão
Falta de civismo. Só no ano passado, acolheram 222 burros, cães e gatos. Animais doentes são deixados como lixo.
Refúgio funciona há 20 anos
"Branquinha" tem 30 anos e foi salvo por um britânico que o acolheu numa quinta.
Dócil, de pêlo branco, com 30 anos, 150 quilos e a ganhar apetite, e a conviver da melhor forma com outros animais sem estranhar a mudança de ambiente e o sol do Algarve. É este o breve perfil do Branquinha, a nova coqueluche da quinta da associação Refúgio dos Burros, localizada no sítio de S. João, em Estômbar (Lagoa), onde se encontra há cerca de um mês, após ter sido abandonado pelo dono, pastor na Serra da Estrela, por já não precisar dele para o trabalho na agricultura.
"Quando um amigo meu, residente naquela zona, me telefonou a dizer que havia um burro abandonado e que se não fosse buscar, o animal acabaria de morrer, respondi-lhe imediato 'Vou já!'. E lá fui salvá-lo. Achei-o muito bonito, embora estivesse muito magro", conta a DN o inglês Peter Lander, de 76 anos, agricultor reformado e responsável pelo Refúgio dos Burros, em funcionamento desde 1991.
"Come here", ordena-lhe, em tom meigo. Obediente, o Branquinha, que já começa a entender o idioma, dá alguns passos na pequena cerca onde está instalado com mais três burros. O novo dono passa-lhe uma mão pelo pêlo, enquanto o animal vai arrebitando as orelhas e contribuindo para que os outros se aproximem. "Estava maltratado. Agora tem comido, desde palha, cenouras e misturas de outros alimentos, até pedaços de alfarrobeiras, mas não o suficiente, além de receber assistência veterinária. É uma óptima companhia", nota Peter Lander, explicando que o Branquinha representa um encargo de 50 Euros mensais.
Chegou ao Refúgio dos Burros, em Estômbar, na madrugada de 20 de Novembro, pelas 3.30. "Como foi recebido? Estava escuro e nenhum dos outros animais o viu nessa altura. Mas não houve problemas", recorda, sorridente, o responsável daquela associação que acolhe neste momento 14 burros, 95 cães, 50 gatos, duas mulas e um cavalo. Os animais contam com a assistência de dois veterinários, um alemão e outro irlandês, residentes no concelho de Lagos.
Se, entretanto, surgir alguém interessado em adoptar o Branquinha, ou outro bicho, Peter Lander, que, contando com vários apoios, gasta 5.000 Euros por mês com a manutenção e tratamento dos animais, analisará a situação. "Só o dou a boas pessoas, que se revelem sensíveis e com condições para tratar dele. Caso contrário, ficará nesta quinta enquanto viver", avisa o inglês, que adora animais. E admite que o mais recente inquilino do Refúgio dos Burros, depois de ter sido desparasitado e encontrando-se agora a ser devidamente tratado, possa viver até aos 40 ou mais anos. Se em Portugal, os burros após serem utilizados no apoio ao meio rural acabam por ser rejeitados pelos donos, em Inglaterra, por exemplo, "são aproveitados para passeios turísticos".
Animais são abandonados junto ao portão
Falta de civismo. Só no ano passado, acolheram 222 burros, cães e gatos. Animais doentes são deixados como lixo.
Só em 2007, o Refúgio dos Burros, acolheu 14 burros, 140 cães e 68 gatos abandonados das mais diversas formas. "Há pessoas que vêm aqui durante a noite e deixam os animais junto ao portão como se isto fosse um depósito de lixo. Existem casos em que os animais estão doentes e os donos já não os querem. São precisas câmaras de vigilância para os identificar", diz, em tom crítico, Valérie Nicolas, francesa, de 36 anos, que colabora há quatro com o refúgio como voluntária.
Acabou por alojar na sua casa dois cachorros, após estes terem sido encontrados pelo proprietário da quinta, Peter Lander, numa dessas noites. "Ele ouviu barulho, levantou-se para ver o que se passava e encontrou duas cadelas bebés ainda com o cordão umbilical. Estou a cuidar delas e até lhes dou biberão", recorda, com ternura, Valérie Nicolas. "Em Portugal", acrescenta "muitas pessoas deixam as fêmeas no caixote do lixo e guardam os machos. Ou, então, matam todos os animais que têm, revelando falta de sensibilidade e, sobretudo, de educação", lamenta, apontando para o facto de existirem "muitas soluções para esterilizar gratuitamente uma cadela ou castrar um cão, essencial para evitar a reprodução". "Chegam aqui animais magoados, com fome ou muito doentes", avança.
Os responsáveis consideram "muito difícil manter a quinta", não existindo já capacidade para receber mais animais. Mas em relação aos burros é diferente, uma vez que a associação, presidida por Peter Lander, foi criada com o objectivo de os salvar. A divulgação feita em jornais portugueses e ingleses tem-lhe permitido sensibilizar pessoas com vista à adopção dos animais que vivem naquele espaço.
Refúgio funciona há 20 anos
Quando há quase 20 anos entrou em funcionamento, o Refúgio dos Burros tinha três asnos, a que se juntaram duas dezenas de cães. O número de burros entretanto ali acolhidos já atingiu as três centenas, após o que muitos deles foram adquiridos por interessados de várias zonas do país, nomeadamente Guarda e Serra da Estrela. Na quinta algarvia, o dia começa com a limpeza dos animais e dos espaços onde se encontram, enquanto a tarde é aproveitada por voluntários para passearem os cães. Com burros, cães e gatos na mesma propriedade, "às vezes há conflitos e é preciso separá-los", explica Valérie Nicolas.
Jornal Diário de Notícias 26.12.2008
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