Se sair cedo, pelas sete ou oito horas, uma família de javalis pode de repente atravessar-se no caminho, correndo sobre as pedras soltas. À medida que se percorre os trilhos, a natureza impõe-se. A Serra da Malcata -essa mesma, a do lince- é refúgio de muitas espécies de animais. E a diversidade das plantas, junto às linhas de água, surpreende.
"A Reserve da Malcata tem uma série de condições, como o isolamento e a tranquilidade que ele proporciona, que fazem dela uma zona ideal para a conservação das espécies", explica Fernando Queirós, director adjunto do Departamento da Zona Centro do Instituto da Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB), que engloba áreas protegidas como a Malcata e Serra da Estrela. Mas nem todo o trabalho de preservação desenvolvido ao longo dos anos foi suficiente para impedir que o lince-ibérico, o emblemático felino que no imaginário nacional ficou sempre ligado à Malcata, desaparecesse da região. Fazê-lo regressar nos próximos anos, senão naturalmente, pelo menos pela reintrodução de uma população obtida por reprodução em cativeiro, é uma das tarefas entre mãos no ICNB. Para isso, a recuperação dos habitats adequados ao lince é uma das frentes de batalha. Na Malcata, mas também noutras regiões onde historicamente a espécie existiu, como por exemplo na Serra de Monchique e Serra de Caldeirão entre outras.
Na Serra da Malcata, a recuperação da flora mediterrânica e da população de coelho-bravo, que constitui 80% da alimentação do lince-ibérico -e que chegou no País a níveis tão baixos que foi considerado quase ameaçado, em 2005- são pedras centrais do trabalho do ICNB.
A criação em 1981 da Reserva Natural da Serra da Malcata permitiu travar ali o avanço dos eucaliptais para produção de celulose. O Estado foi comprando terrenos e hoje a Reserva tem 16.348 hectares. Há por lá javalis, corços, veados e, nalguns pontos, em zonas de planalto, já se contam cinco coelhos-bravos por hectare, quando essa densidade era ali de um por hectare há dez anos.
O surgimento de duas doenças -a mixomatose nos anos 50 e a febre hemorrágica na década de 80- devastaram cerca de 90% dos exemplares de coelho-bravo. A perseguição directa dos animais nas décadas de 50 e 60, e depois o abandono das práticas agro-pastorais tradicionais, que favoreciam o coelho e o lince, devido à emigração das populações da região, determinaram o desaparecimento do lince.
O último foi avistado na Malcata em 1992. Mas nas Terras do Lince, marca que Penamacor escolheu para a sua imagem pública, aguarda-se com ansiedade que ele volta. Seria, sem dúvida, uma ajuda para revitalizar a região.
Diário de Notícias -2.8.2009-
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